20111130

4 Temas de Bertazzo - I



O Quadro Contemporâneo de Fragmentação

'É fácil compreender a procura pela musculação em nossos dias, a grande afluência à academia de "malhação". Na verdade, as pessoas que procuram a "malhação" talvez o façam por serem carentes de sensações de estrutura; necessitam forjar uma presença, uma sensação de unidade. Como censurá-las? A sensação de desintegração que enfrentam no quadro de fragmentação do mundo moderno é desesperadora e elas necessitam, com razão, de sensações estruturantes. Infelizmente, esses métodos criam também densidades contrárias ao movimento.

Se a fragmentação é o tema de nossa época — conhecemos as partículas subatômicas, divisíveis ao infinito —, é preciso, por outro lado, somar, fundir e encarnar — assumir um corpo — para compensar essa tendência. Se alta velocidade e divisão extrema — os confrontos de etnias, nações, moralidades etc. — formam o panorama externo, é preciso fortalecer a unidade em nosso interior para suportar tais condições.
Como observa Mme. Struyf, se os grandes símbolos de nossa época são os carros fantásticos, os aviões supersônicos, e não mais as arquiteturas estáticas — a catedral, o palácio —, não esqueçamos que, da mesma forma que a máquina superveloz possui estrutura complexa, extremamente precisa e organizada para permitir o deslizamento sobre a água ou pelo ar, o homem faz uso de uma estrutura refinada para ficar em pé. Se o barco tem o arcabouço que o sustenta à flor da água, nós possuímos nosso esqueleto, que nos sustenta em pé e nos permite caminhar.

É nesse sentido que Mme. Struyf insiste que a estruturação começa em nossos ossos, e não em nossos músculos: "Sem eles, seríamos um patético saco de pele escorrendo pelo chão".
O ser humano tem à sua disposição uma máquina de movimento de design extremamente sofisticado. Entretanto, na maior parte do tempo negligencia essa dádiva. Isso tem provocado, e provocará ainda, inúmeras disfunções: se continuarmos pautando nossa evolução sem qualquer atenção ou percepção desses fundamentos, com certeza mais adiante seremos obrigados a voltar sobre nossos passos para reestimular nossas bases sensórias. '

Ivaldo Bertazzo, 'O Cidadão Corpo', página 36

20111123

(... Klaus Vianna ...)



Além disso, existem diversos pontos em nosso corpo que são verdadeiros centros nervosos irradiadores de energia, associados às emoções: o queixo, a região da traqueia, o esterno, a crista do ilíaco, a região do púbis, a coxofemoral.


Esses pontos, quando bloqueados, acumulam tensão, e em torno deles vai se formando uma verdadeira couraça muscular. O equilíbrio dessas tensões - entendido como a tonicidade ideal dos músculos — permite também o equilíbrio das emoções que derivam de cada um desses pontos.

Há uma diferença muito grande, por exemplo, entre a emoção expressa através do esterno — que atua mais no sentido da projeção — e a emoção que flui da região dos quadris. Esses pontos ou articulações não atuam apenas como dobradiças do corpo, mas também como marcos divisores das mais diferentes emoções. De certa forma, a cada grupo muscular e articular corresponde determinada emoção, e, dependendo da emoção que se queira transmitir, deve-se privilegiar o trabalho com esse ou aquele grupo muscular, essa ou aquela articulação.

Se estamos construindo um personagem cuja característica principal seja o medo, por exemplo, o centro é a parte mais ligada a essa emoção. Alguém com a sensação de medo tende a se fechar, arqueando os ombros e apoiando-se nas costas. Quando os espaços articulares são satisfatoriamente preservados, o jogo de emoções associadas a esses pontos pode ser plenamente sentido.

Quando iniciamos um trabalho corporal da maneira como proponho, esteja ele voltado para a dança, o teatro ou qualquer outra atividade, a primeira necessidade que se impõe é a derrubada da parede que separa a sala de aula, onde exercitamos nosso corpo, do mundo exterior, onde vivemos nossa vida cotidiana. Não podemos nos esquecer de que o corpo que queremos exercitar é o mesmo com o qual nos acostumamos a correr, brincar, amar ou sofrer. Quanto mais levarmos em conta essa dimensão existencial revelada por meio do nosso corpo, quanto mais considerarmos as dúvidas e os questionamentos que nascem na relação com o mundo exterior, mais proveitoso poderá vir a ser o trabalho realizado e tanto mais rico o resultado obtido.

Por outro lado, a relação professor-aluno não deve ser muito diferente das relações que mantemos com as pessoas em nossa vida diária. É muito comum, pelo menos nos estágios iniciais, a tendência do aluno a projetar no professor sua necessidade de um ponto de referência externo, uma figura destinada a absorver todo gênero de carências.

Mas, quando essa transferência ocorre e é detectada pelo professor, este deverá encontrar um meio de permitir que o aluno se dê conta do fato, pois assim poderá ajustar-se ao trabalho e a si mesmo. A relação do tipo professor-guru-onipotente e aluno-fiel-subserviente pode ser muito prejudicial ao trabalho que se está desenvolvendo, assim como à própria vida.

Ao longo desse processo, é fundamental considerar a relação mundo—eu, verdadeira origem e motor do movimento e da própria dança, pois é da dinâmica desse relacionamento que emerge a singularidade que faz de cada pessoa um ser único e diferenciado. Por meio da vivência da relação mundo—eu, o eu interno desabrocha a partir do amadurecimento do eu social, que nada mais é do que a forma de nos relacionarmos com o mundo exterior.

A descoberta do eu interno, de um ser único, individual e criativo, é indispensável ao exercício da dança, se quisermos que ela se torne uma forma de expressão da comunidade humana. Desde o nascimento somos submetidos a uma série de condicionamentos sociais, antes mesmo de vivermos os processos de educação formal —, o que acaba resultando em procedimentos mecânicos e repetitivos, dos quais não temos percepção ou consciência.

Se isso, de um lado, facilita a nossa existência cotidiana, de outro, afasta e dificulta o processo de autoconhecimento. Em outras palavras, a memória robotizada pode produzir formas já catalogadas e conhecidas, mas dificilmente criar movimentos novos e ricos em expressão.

E a dança não significa reproduzir apenas formas. A forma pura é fria, estática, repetitiva. Dançar é muito mais aventurar-se na grande viagem do movimento que é a vida. Nesse sentido, a forma pode comparar-se à morte e o movimento, à vida.

Os movimentos circulares são os mais relaxantes para o corpo. De certa forma, eles liberam as articulações e os grupos musculares, permitindo o equilíbrio ósseo e muscular, ao con¬trário da linha reta, que às vezes bloqueia e impede a exploração das mais diversas possibilidades de movimento.

Essa linha curva, ou redonda, vai gerando anéis musculares por todo o corpo. Estes, por sua vez, se não evoluírem para uma espiral, provocarão a tensão. Assim, o movimento circular deverá procurar sempre o caminho da espiral, de uma curva aberta, pois do contrário giraremos, mas seremos incapazes de sair do lugar.

De qualquer forma, técnica não é estética. Apesar de ter um sentido utilitário na dança, a essência da técnica constitui apenas uma forma de organizar e difundir um determinado conhecimento a respeito do próprio corpo e das possibilidades de movimento.

Essa técnica, portanto, deve ser cristalina, transparente, pois de que adianta fazermos uma série de movimentos formalmente considerados bonitos se isso não traduz ou expressa nada, se não há objetivo ou intenção naquilo que fazemos e se, acima de tudo, não contribui para nosso autoconhecimento?

Há uma mentalidade predominante que concebe a técnica como um fim em si, quando na verdade ela deve ser mais um meio eficaz e em plena sintonia com os fins que proponho atingir. E a técnica eficaz talvez seja aquela que torna possível extrapolar todos os falsos e repetitivos conceitos de beleza, que permite criar ou revelar a identidade entre a dança e o dançarino, entre quem dança e o que está sendo dançado.

Podemos dizer que o que faz a beleza de um movimento é a clareza, a objetividade. Quando o movimento é limpo, consegue expressar aquilo que busca expressar e, como consequência natural de sua verdade, ganha em beleza e emoção. Precisamente aí reside seu valor estético.

É muito difícil manifestar um sentimento, uma emoção, uma intenção, se me oriento mais por formas condicionadas e conceitos preestabelecidos do que pela verdade do meu gesto. O que confere autenticidade e expressão a um dado movimento coreográfico é precisamente o poder que ele tem de traduzir certas emoções, sentimentos ou sensações, de tal forma que seria impossível traduzi-los de outra forma ou por meio do recurso de outra linguagem. Ou seja: o que é dançado é dançado por alguém que vive intensamente aquele movimento, aquele gesto, e, por isso, consegue expressá-lo plenamente.

Quando soltamos nosso corpo — o que não significa despencar — , o movimento que executamos flui livremente, obedecendo a uma forma de organização natural, a uma linguagem gestual que, de algum modo, já constitui parte de nossa dinâmica e está em harmonia com nossa capacidade anatômica e funcional, com nossa capacidade de movimento.

Em contrapartida, as situações sociais e culturais influenciam muito o comportamento gestual e postural que adotamos. Por exemplo, as sociedades polinésia, havaiana e taitiana, célebres pela liberdade de costumes, produzem naqueles povos posturas e movimentos flexíveis e redondos, denotando o grau de liberdade que aquelas pessoas desfrutam. Já uma sociedade guerreira, de caçadores, como a de certas tribos africanas, produz posturas e movimentos fortes, intensos, de grande concentração e conteúdo rítmico.

As técnicas excessivamente formais, que desconsideram esses fatos, quase sempre caem no vazio, no limite dos gestos artificiais e desprovidos de emoção. Nesse caso, os movimentos são confusos e pouco objetivos, e o que se apresenta como emoção são apenas máscaras, artifícios tecnicamente produzidos, sem qualquer relação com um impulso vital. O que essas técnicas ignoram é a própria vitalidade do movimento.

Obviamente, nosso corpo necessita de certos códigos para que possa se exprimir. Entretanto, esses códigos devem brotar do movimento que executamos a partir de nossa própria linguagem gestual, daquela linguagem que empregamos no dia-a-dia.Tendo consciência dessa linguagem, posso me comunicar por intermédio dela, posso dançar com ela.

Se não conseguimos estabelecer um contato consciente com o nosso eu interior, contato que normalmente se perde a partir da infância, ficamos impotentes e incapazes de criar um verdadeiro diálogo, seja ele qual for. Em linguagem corporal, isso se traduzirá em gestos, posturas e atitudes medrosos, limitados, inseguros, revelando a maneira como nos projetamos no mundo.

O fato de cada pessoa ser, em síntese, o próprio mundo, um microcosmo, permite que ela encontre respostas para suas dúvidas, paixões e ansiedades quando mergulha com coragem e técnica em seu universo interior. Talvez seja isso que faz que grandes atores representem um mesmo personagem centenas de vezes, sempre de maneiras distintas. Ou seja: buscando em si a verdade daquele personagem, o ator pode conseguir a cada nova apresentação explorar aspectos novos e inéditos do ser fictício — mas ao mesmo tempo real — que encarna.

O mesmo processo aplica-se à construção dos tipos ou personagens do bale clássico: quando essa técnica é devidamente aplicada, as Giselles, Odetes e Copélias deixam de ser personagens acadêmicos para tornarem-se verdadeiros clássicos; deixam de ser estereótipos de personalidades humanas para atingir a dimensão de autênticos arquétipos da humanidade.

No teatro ou na dança, o ator e o bailarino desencadeiam, a partir de sua individualidade, um rico processo criativo, pelo qual os elementos técnicos adquiridos podem ser codificados e, em seguida, representados. A técnica cumpre aqui a tarefa de dar corpo e alma a cada tipo ou personagem que se queira representar. Este, para mim, deve ser o processo de criação capaz de produzir obras e manifestações verdadeiramente artísticas.

No terreno da arte, a obra só toma corpo na relação que o artista mantém com a realidade que o cerca, mesmo que essa relação seja atravessada pelas mediações mais sutis. O artista, como criador, mais do que ninguém necessita aguçar sua percepção do real, e o momento da criação pressupõe e ao mesmo tempo encerra o processo de autoconhecimento.

O corpo humano é uma síntese do universo. Não sou eu quem diz, nem tal coisa foi dita apenas no século xx. Mas sabe¬mos que no corpo todas as relações, todas as proporções universais estão de alguma forma contidas - e é precisamente essa infinidade de atributos, funções e possibilidades que faz do corpo um verdadeiro mistério.

Apesar de todo o conhecimento acumulado a seu respeito, o corpo humano ainda não foi completamente explorado e talvez nunca cheguemos a conclusões definitivas sobre suas potencialidades. De qualquer forma, sua existência revela a presença de algo cuja dimensão transcende a própria materialidade: aquilo que comumente chamamos de energia vital.

Atualmente, em diversos países, desenvolve-se um amplo trabalho no campo da bioenergética, que permite sustentar a ideia de que a energia é a base da própria vida. Como potencializar e canalizar essa energia em um sentido criativo é o que nos interessa mais de perto, tanto no domínio da arte quanto da própria vida.

Mesmo relativizando a onipotência que se costuma atribuir ao homem como ser racional, é impossível negar sua capacidade consciente de lançar mão dessa energia, modificando-se ou intervindo em processos naturais. A própria atividade biológica, caracterizada por um contínuo movimento, é a usina que produz essa energia vital e gera um fluxo energético que se processa por todas as áreas do corpo humano.

Em algumas dessas áreas, esse fluxo é bem mais visível, como nas mãos e nos pés, regiões que se comunicam com o mundo externo de forma muito mais intensa. Além dessas regiões, o plexo solar, o esterno, a garganta e a virilha são grandes centros nervosos nos quais também se realiza um intenso fluxo energético.

Por meio da energia vital produzida por minha atividade biológica relaciono-me com o mundo, comigo mesmo e com tudo que me cerca. Minha energia vital cresce na mesma medida que o meu trabalho corporal torna-se consciente. Quanto mais presente em mini mesmo eu estiver, quanto mais atento a cada gesto ou deslocamento, maior poderá ser a minha produção e concentração de energia vital.

Movido por essa necessidade fundamental — a consciência de mim — é que procuro, com o meu trabalho, proporcionar às pessoas uma consciência corporal baseada na percepção dos espaços internos do próprio corpo. Nesses espaços, que em geral correspondem às diversas articulações, localizam-se fluxos energéticos e inserem-se os vários grupos musculares.

Ainda é bom ressaltar que a preservação do espaço corporal atua para garantir uma boa relação de equilíbrio, pois quando se subtrai o espaço corporal, surge a tendência à diminuição da capacidade de equilíbrio e quando se consegue preservar e ampliar esse espaço, o equilíbrio alcança um ponto satisfatório.

Para entender essa relação, mesmo sabendo que o corpo constitui uma totalidade indivisível, podemos exemplificar dizendo que existem dois tipos de equilíbrio (ou desequilíbrio) que se influenciam mutuamente: o interno e o externo. Um dado equilíbrio (ou desequilíbrio) externo gera um dado equilíbrio (ou desequilíbrio) interno. E vice-versa.

Do mesmo modo, existe um espaço interior, emocional, mental, psicológico, e um espaço exterior, que é onde se manifesta a dinâmica do corpo. A sensação de equilíbrio corresponde ao momento ou aos momentos em que descobrimos uma maneira harmônica de utilização do espaço, em que equilíbrio interior e exterior já não se diferenciam mais.

O homem se insere no universo e atua como síntese desse universo de tal maneira que, ao me conhecer e conhecer a humanidade, estou desvendando o próprio universo. Essa relação pode ser esmiuçada até o nível celular, como parte de um processo ba¬seado na dialética da própria natureza, que conforma e dispõe as coisas e os homens independentemente de qualquer vontade.

Como homens e seres naturais, deveríamos considerar e procurar respeitar as leis da natureza também inerentes a nós.

O fato de sermos indivíduos culturais não elimina essa verdade, apesar de nos afastar cada vez mais dela. O que proponho é a retomada das leis naturais que regem toda existência, exatamente por meio do trabalho consciente.

Klauss Vianna, A Dança, páginas 110 até118

20111118

O que não é Relaxamento Consciente


Relaxamento Consciente é muito diferente de relaxar lendo um livro,ou vendo TV.

Lendo livro ou vendo TV, a pessoa raramente sabe o que está fazendo com o corpo e a respiração.
Relaxamento consciente é muito diferente do relaxamento do final da aula de Dança Contemporânea ou da aula de Pilates, pois em geral, no fim destas práticas, as pessoas estão com os músculos doloridos das repetiçõess e da falta de oxigenação muscular, não há uma preocupação em posicionar o corpo com excelência para a atividade de relaxar, não houveram antes práticas que despertarem mecanismos fisiológicos de relaxamento (como provocam os aasanas feitos com permanência) e a duração do relaxamento é curta (não dá tempo do mecanismo fisiológico de relaxamento de todo o corpo responder).

Relaxamento consciente é mais eficiente que uma noite de sono, pois durante o sono não sabemos o que fazemos com nosso corpo, com nossa respiração, e muitas pessoas não relaxam na cama o suficiente para ter uma noite de sono revigorante porque 'o cabeção' não desliga.

20111117

Yoga-Nidra


Segundo os Tantras, "A tranquilidade e a paz vêm de dentro para fora." Todos deveriam gozar da possibilidade de penetrar até o subconsciente de maneira a reconhecer as bases estruturais da sua personalidade, podendo assim resolver seus conflitos e tornar-se uma pessoa mais equilibrada (saudável).

  1.  Tensão física ou muscular gerada pelo sentimento de culpa por não vivenciar a plenitude do ser. Está ligado ao Brahma Granthi do Muladhara Chakra.
  2. Tensão emocional gerada pelo sentimento de aban-dono por não se sentir amado, necessário. Está ligada ao Vishnu Granthi do Anahata Chakra. 
  3.  Tensão mental ou psíquica gerada pelo sentimento de Inferioridade por não saber, verdadeiramente, quem é. Está ligada ao Shiva Granthi do Ajna Chakra.
 Os três tipos de tensão originam doenças, inibições, complexos, ansiedades e toda uma gama de sofrimentos. Estes sofrimentos, normalmente, estão ligados aos três complexos principais, que por sua vez estão ligados aos três Granthis, três principais dificuldades da passagem da energia sutil (Prāna) pela Susumna Nadi.
  
Desta forma, ressalta-se a necessidade de um processo de conscientização das tensões existentes e seu consequente relaxamento, ou vice-versa.
  
Os psicólogos dizem: "O completo relaxamento físico nos prepara para investigações mais profundas no campo do inconsciente."
  
Yoga-Nidra é conhecido como método de relaxa mas precisa-se dar ênfase ao fato de que ele objetiva o equilíbrio físico, mental e espiritual (essa divisão é meramente didática, não existindo na realidade) através do relaxamento profundo consciente.
  
A prática é baseada num rodízio de conscientização que a mente focaliza as diferentes partes do corpo, Pranayama, Chidakasa, Dharana e visualização interior.
  
Considerando que Yoga é um processo de comunhão, a integração dos conteúdos conscientes e inconscientes determina uma personalidade mais equilibrada e plenamente consciente.
  
Dessa forma, o relaxamento consciente alcançado em Yoga-Nidra possibilita observar (como espectador) uma liberação de imagens subconscientes carregadas de emoções e conteúdos que foram reprimidos, Sanskaras.
  
Esses conteúdos reprimidos são a causa de nossas tensões profundas e da constante inquietude da mente, e ficam interferindo subliminarmente em nossos comportamentos na vida diária. Condicionam nossos pensamentos conscientes e experiências, e nos compelem a reagir às situações de forma razoavelmente previsível.
  
Assim que se atinge o relaxamento profundo consciente, esses conteúdos passam a emergir e torna-se importante manter-se como observador, sem se envolver.
  
"A consciência é o que quebra os laços do envolvimento pessoal, sendo o meio de se libertar das impressões ou Samskaras.

Etapas do Processo Relaxamento
Pratyahara (Abstração dos Sentidos)
Aqui pretendemos desenvolver a capacidade da nossa de ignorar a abundância dos estímulos externos, interiorizando-se.
  
A mente, porém, comporta-se como uma criança rebelde. Faz exatamente o contrário do que queremos que faça. Assim, se nós a obrigarmos a pensar em fatos do mundo exterior enquanto os olhos estão fechados, a mente, aos poucos, tendo a perder o interesse neles e se fecha automaticamente, que é o que desejamos em Yoga-Nidra.
  
Deliberadamente fixamos a atenção em sons externos e saltamos de som para som, conservando a atitude de espectador. Depois de certo tempo, a mente perde o interesse nesses sons e se fecha para eles.
  
Afastamos os mais importantes meios de comunicação da nossa mente com o mundo exterior, pelo simples falo fecharmos os olhos e praticar Antar Mouna. Isso deixa o tato como fonte mais forte de estímulo do mundo exterior, paladar e o olfato são relativamente neutros.
As sensações do tato são quase anuladas se adotarmos a posição de Shavasana, em que os braços e pernas mantém-se afastados do corpo e as palmas das mãos voltadas para cima de maneira a evitar a estimulação táctil.
  
Rodízio de Conscientização
Tendo reduzido a interferência dos estímulos externos,a atenção tende a concentrar-se no corpo. Portanto, o passo seguinte é afastar a mente do corpo. Para atingir esse objetivo há uma conscientização deliberada de cada parte do corpo físico, em um rodízio que se repete um certo número de vezes.
  
Após algum tempo, percebemos que a mente demonstra uma tendência a interiorizar-se.
  
Além disso, esse rodízio vai provocando um acentuado relaxamento, que serve para diminuir de maneira considerável a penetração no cérebro dos estímulos físicos.
  
De modo geral, a parte seguinte do exercício é a consciência da presença da respiração, quando se pode introduzir alguma visualização, como por exemplo tentar ver nosso próprio corpo como se estivessemos fora dele.
  
A consciência ou a conscientização da respiração traz na maior introversão. Não se deve alterar o ritmo respiratório, apenas observá-lo.
  
O exercício continua na profundidade das emoções ou sensações psicossomáticas. Faz-se um rodízio de concientização de sensações. Primeiro, sensações de aspectos físicos, como leveza, calor, etc. Depois, passamos para o plano mental: dor, prazer, e, se for desejável, ira, medo, ciúme e amor.
  
Visualização
Neste momento a mente já está inteiramente introvertida, embora ainda haja consciência da voz do instrutor.
Esta é a fase em que vários pensamentos e imagens surgem do consciente e do subconsciente, interferindo no processo para a concentração. Em vez de bloquear esses pensamentos e imagens, nós nos utilizamos deles, fazendo um rodízio de conscientização por determinadas imagens e pensamentos, até que eles percam seu poder dispersivo. Usam-se outras imagens e símbolos que possam perturbar as camadas mais profundas da mente e trazer à tona seu conteúdo. Uma vez iniciado esse processo de purificação, a tendência é que ele prossiga espontaneamente. A indicação de que ele realmente continua é quando uma sucessão de pensamentos imagens emergem durante a prática de conscientização do espaço interior (Chidakash).
  
Nós devemos continuar como meros observadores o sucessão de imagens deve ser orientada rápida e ritmadamente.
  
Dharana
A sucessão de imagens tem dupla finalidade: desenvolver poderes de visualização e evitar a dispersão do consciente e do subconsciente, empregando o poder de associação. Nossa mente, então, concentra-se cada vez mais e nos torna receptivos e prontos para a prática de Dharana, quando o consciente focaliza determinado objeto por certo tempo.
  
Normalmente usamos a imagem de um ovo dourado, que é um símbolo psíquico muito poderoso e que facilita particularmente a concentração.
Meditação pura é a experiência da conscientização desse objeto dentro do inconsciente. Então, a fronteira entre consciente e inconsciente se desfaz e as imagens psíquicas desaparecem.
  
Resolução ou Propósito
A Resolução é uma ordem do consciente para o subconsciente. Depois o poder do subconsciente forçará a ordem a retornar ao consciente, e ela se manifestará em nossas ações e comportamentos.
Nossos pensamentos e ações de agora são influenciados por experiências passadas. Nossas experiências presentes determinarão nosso comportamento futuro. O ciclo de ação e reação chama-se Karma.
  
Não somos vítimas indefesas do destino; cada um de nós dentro de si o poder de moldar sua estrutura mental. A semente da mudança é o Propósito que formulamos em Yoga-Nidra.
  
É muito mais construtivo e aconselhável empregar a Resolução ou Propósito para um fim positivo que influencie uma vida, que inclua um desejo verdadeiro de mudar a personalidade. Ao obtermos um resultado assim, ganhamos automaticamente a força necessária para vencer hábitos e vícios indesejáveis.
  
Precisamos SENTIR o nosso Propósito, pois o inconsciente reconhece sugestões que trazem em si a força do impulso emocional e reage sob a influência delas.

Aspectos Psicológicos
No Ocidente, psicólogos descrevem a mente como tendo duas divisões principais: consciente e inconsciente.
  
O consciente predomina durante as horas em que estamos acordados. Sua característica básica é a noção do EU (Ego) e tem por função a resolução de problemas e o raciocínio (analisar, comparar e concluir).
  
Os seguidores de Freud afirmam que o inconsciente é o depósito de todas as experiências passadas não compreendidas, geralmente dolorosas. Estas experiências reprimidas ainda vivem e são a origem de nossas fobias e obsessões. Também no inconsciente localizam-se nossos instintos e desejos, permanentemente em luta para emergir no consciente, competindo pela própria expressão e satisfação.
  
Entre o consciente e o inconsciente existe um limiar de tensão que atua como Censor. Isto é, filtra que informações devem aflorar na consciência.
  
Esse Censor é necessário para nossa concentração no trabalho que executamos.
O Censor assimila ao longo da vida as informações (valores, conceitos, preconceitos, noções de certo e errado etc.), e de acordo com nossos complexos, inibições, simpatias e antipatias, ele alimenta o nosso consciente com as informações que se mostram mais "adequadas", determinando nossas ações e reações.
Se temos medo de algo, a informação sensorial será enviada ao consciente de acordo com o padrão de comportamento aprendido e "adequado", determinando a nossa resposta. Por exemplo: Um homem que aprendeu que "Homem não chora e não tem medo", diante de algo que o apavora, fingirá não ter sido atingido pelo estímulo. Enquanto isso, o conteúdo emocional correspondente à intensidade do estímulo (medo, insegurança, necessidade de gritar, chorar, fugir etc.), que é "inadequado" no padrão de comportamento aprendido, será bloqueado.
Os preconceitos do Censor nos impedem de ver o mundo claramente. Mas não impedem que o inconsciente esteja sempre alerta, enviando informações para o consciente, mesmo durante o sono.
  
A entrada nas áreas do inconsciente, onde estão nossa intuição e criatividade, nos é proibida, assim como o ingresso no âmbito geral do Inconsciente Coletivo (registro de experiências herdadas de nossa raça e de nossa cultura).
  
É claro que a Censura é necessária para que funcionemos bem, mas uma Censura muito restritiva pode separar-nos de partes positivas e esclarecidas da nossa mente, inibindo a capacidade de análise e questionamento.
  
Yoga-Nidra nos auxilia a harmonizar o consciente e o inconsciente e nos conduz a um estado em que a Censura não é necessária, pelo menos durante certo tempo.


'A Psicologia do Tantra', de Paulo Murilo Rosas, páginas 211 a 219.